A palavra “liturgia” tem origem no termo grego “leitourgia”, que significa “serviço público” ou “obra do povo”. Embora seja mais comumente associada ao culto religioso, particularmente à forma estruturada de culto público em contextos cristãos, o conceito pode ser estendido a um sentido mais amplo do mundo real. 

Num ambiente religioso, liturgia refere-se à forma estabelecida de ritos e rituais prescritos para o culto público em várias tradições religiosas. 

Num contexto mais amplo e secular, ‘liturgia’ assume um papel metafórico, referindo-se a qualquer rotina prescrita ou conjunto de práticas realizadas por uma comunidade. Isso pode incluir inaugurações, eventos de comemoração, celebrações nacionais, danças tradicionais, festivais ou práticas culinárias regularmente observadas em encontros comunitários. 

Surpreendentemente, Deus originalmente projetou o cosmos para funcionar liturgicamente como um templo massivo no qual Ele poderia habitar com Sua criação, com os seres humanos como portadores de Sua imagem. Todo templo tem imagens das divindades (neste caso, humanos (Gênesis 1:26)) repletas de liturgias. Isso implica que Gênesis 1 não é apenas uma explicação científica dos começos, mas o relato inspirado do primeiro serviço de adoração cósmica! 

O conceito de que o universo foi criado como um templo cósmico é um tema significativo na teologia do Antigo Testamento, particularmente evidente nas narrativas da criação. Ou seja, cada dia da criação paralela às etapas tomadas na dedicação de um templo, onde Deus está ordenando sistematicamente o caos em um cosmos, muito parecido com a forma como um espaço sagrado é organizado para a adoração. A culminação desse processo é o sétimo dia, o Sábado, que Deus santifica. Esse dia de descanso pode ser visto como semelhante a Deus tomando residência em Seu templo. 

“Ele construiu o seu santuário como os céus altos, como a terra, que ele fundou para sempre.” (Salmo 78:69) 

O Salmo 132:13-14 fala de Sião como o lugar de descanso de Deus para sempre, onde Ele deseja habitar, reforçando a ideia do cosmos como um espaço projetado para a presença de Deus. 

Além disso, o Tabernáculo de Moisés é retratado como um microcosmo do cosmos. Por exemplo, os materiais usados (ouro, azul, púrpura, tecidos escarlate e linho fino) e a construção do Tabernáculo refletem a ordenação e a beleza resplandecente do cosmos em Gênesis. 

Isaías 66:1-2 fala da transcendência e imanência de Deus, afirmando que o céu é seu trono e a terra é seu estrado. Tal imagética sugere que todo o cosmos é seu templo. 

A Ordem Criada como Liturgia Divina 

Como afirmado em Gênesis 1, a estrutura e a rotina da criação podem ser vistas como liturgia, onde Deus metodicamente estabelece a ordem do cosmos através de uma série de atos realizados ao longo de seis dias, culminando num dia de descanso. Esta narrativa estabelece os aspectos físicos do universo e estabelece um ritmo e uma ordem fundamentais que refletem a soberania e a intenção criativa de Deus. As atividades de cada dia são realizadas deliberadamente, enfatizando regularidade e propósito, semelhante a atos litúrgicos num ambiente de adoração. 

Dia 1: A separação da luz e das trevas 

Dia 2: A separação das águas para criar o céu e as águas 

Dia 3: O desenvolvimento da terra, mares e vegetação 

Dia 4: Sol, Lua e Estrelas 

(Aqui, Deus estabelece os marcadores de tempo celestiais, cruciais para o calendário litúrgico em práticas religiosas, que muitas vezes são governadas por ciclos lunares ou solares.) 

Dia 5: Peixes e Aves 

(Isso demonstra uma continuação da ordenação do mundo ao enchê-lo de vida, bem como reflete a diversidade dentro da ordem criada.) 

Dia 6: Animais terrestres e humanidade 

(Aos humanos foi dada a responsabilidade pela administração, espelhando o papel litúrgico dos sacerdotes que supervisionam os ritos sagrados.) 

Dia 7: Sábado de Descanso 

(Isso estabeleceu um padrão de trabalho e descanso, central para os ritmos humanos e práticas litúrgicas) 

Portanto, neste cenário “litúrgico”, cada ato de criação por Deus é como um movimento em uma sinfonia, cuidadosamente colocado para trazer um universo harmonioso governado por leis e ritmos que refletem a sabedoria divina, bem como um ritual sagrado. Isso ilustra como a própria criação é um ato de adoração divina, estabelecendo rotinas e cerimônias que espelham práticas sagradas em um templo. 

Infelizmente, a queda da humanidade, como retratada em Gênesis 3, introduziu a discórdia neste sistema bem ordenado, que interrompeu a harmonia perfeita entre o céu e a terra, entre os reinos espiritual e natural, das seguintes maneiras: 

  1. Houve uma interrupção na Relação Humano-Divina

O efeito imediato do pecado de Adão e Eva foi a ruptura da relação íntima entre a humanidade e Deus. 

  1. Isso causou a corrupção da natureza

De acordo com Romanos 8:19-22, toda a criação “geme” como resultado do pecado humano. O pecado de Adão teve um impacto negativo no solo e no meio ambiente. 

  1. Isso impactou as relações humanas e as estruturas sociais

O pecado alterou a natureza humana e introduziu uma propensão para o mal e a rebelião, muitas vezes levando à injustiça, opressão e várias formas de degradação, o que interrompeu os ritmos litúrgicos de justiça, paz e adoração a Deus por meio do cuidado da criação. 

  1. Isso causou uma quebra no tempo litúrgico

A rebelião humana interrompeu os ritmos sagrados do tempo estabelecidos pelo descanso do sábado. Quando o pecado entrou, este ritmo foi interrompido por ansiedades humanas, ganância e desconsideração pelo descanso divino e ecológico. 

  1. Exemplos de desalinhamento hoje em dia.

Quando as pessoas abraçam definições e expressões desviantes de casamento, família, autoexpressão e sexualidade humana, elas violam o design original e a ordem litúrgica da criação. O resultado é um afastamento ainda maior da harmonia cósmica que Deus originalmente pretendia que alinhasse o céu e a terra. 

Consequentemente, a rebelião contra o design litúrgico e o ritmo de vida continuará a erodir a qualidade de vida em nossas cidades e a desencadear mais desastres naturais à medida que a criação reage adversamente contra a falta de harmonia no padrão cósmico. 

A Solução 

Jesus, como o Último Adão, veio para restaurar a ordem litúrgica da criação reconciliando todas as coisas com Deus, possibilitando assim um retorno à rotina harmoniosa original de adoração e administração (Colossenses 1:20). 

Como o divino Logos que criou o mundo antigo (Gênesis 1:1; João 1:3), Jesus veio para recriar o cosmos para estar em total harmonia sob o governo Divino. Os milagres de Jesus, seus ensinamentos, Sua representação como a luz do mundo, trazendo novo nascimento aos crentes, e Suas ações foram os começos proféticos da recriação ou restauração do mundo para sua ordem divina pretendida. A descrição de João de Jesus transformando água em vinho no casamento em Caná (João 2:1-11) e outros sinais ao longo de seu evangelho ilustram vividamente este tema de nova criação. Transformar água em vinho simboliza a capacidade de Jesus de transformar os elementos fundamentais do mundo, semelhante à transformação envolvida na nova criação. Como a água foi um elemento-chave na narrativa da criação em Gênesis (separação no Dia 2 e reunião no Dia 3), o vinho no evangelho de João representa riqueza, abundância e alegria do Reino vindouro. 

Desde que o pecado e a rebelião distorceram fundamentalmente as rotinas litúrgicas estabelecidas em Gênesis 1 ao introduzir desordem, sofrimento e decadência no mundo, Deus chamou os seguidores de Cristo para participar com Ele na renovação de todas as coisas vivendo de acordo com seu design litúrgico praticando: 

Administração da Terra 

Deus chamou seu povo para novamente liderar na administração de todos os aspectos da terra para que sua vontade e Reino possam vir na terra como no céu (Lucas 11:2-4). 

Promoção da Justiça e Equidade 

A ética bíblica enfatiza fortemente a justiça, misericórdia e compaixão, especialmente para com os pobres, marginalizados e oprimidos (Miquéias 6:8). A igreja, como Seu Corpo, incorpora esses princípios como congregações em cada comunidade. 

Promoção da Comunidade e Relacionamentos 

Se todos no Corpo de Cristo incorporassem os valores de Mateus 22:37-40 e promovessem famílias biológicas saudáveis e comunidades solidárias, eles poderiam devolver a paz de Deus às cidades quebradas. 

Observância das Disciplinas Espirituais 

Se o Corpo de Cristo praticasse regularmente as disciplinas espirituais da oração, jejum, contemplação, adoração corporativa e oração, ajudaria a cultivar um senso de paz e contentamento em suas comunidades, reduzindo as tendências à ganância, inveja e contenda. 

Modelagem do Perdão e Graça 

Ao praticar o perdão, os indivíduos podem quebrar ciclos de retaliação e violência, abrindo caminho para a reconciliação e ecoando a paz do estado edênico. 

Em conclusão, uma vida ética de acordo com o design litúrgico cósmico de Deus ajuda a restaurar a harmonia original da criação, reduzindo o caos e a discórdia e promovendo a paz e o florescimento em todos os níveis de existência. 

PERSPECTIVES WITH JOSEPH MATTERA

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